Disciplina, ética e a certeza de que se está agindo de acordo com valores pessoais são atitudes essenciais para desenvolver o amor-próprio, diz o psicanalista Flávio Gikovate. Adepto da terapia breve, o psicoterapeuta Flávio Gikovate atendeu pelo menos 7 mil pacientes em 37 anos de carreira. Além do trabalho em consultório, sempre difundiu a Psicologia participando de programas de televisão e escrevendo artigos e livros, 16 ao todo, entre os quais A Arte de Viver Bem e O Instinto do Amor. Casado, pai de três filhos já adultos, ele fala sobre a importância da auto-estima, que na sua opinião depende principalmente de se ter princípios e viver de acordo com esses valores éticos. O que é auto-estima?
Gikovate: É um juízo, um julgamento que eu faço a meu respeito. É quando acho que sou uma pessoal legal, quando estou satisfeito com a minha conduta. A auto-estima ficará em baixa se eu agir em desacordo com os meus próprios valores. O senhor pode dar um exemplo?
Gikovate: Se eu me propuser, por exemplo, a parar de fumar e não parar, isso baixa minha auto-estima. Se decidir fazer ginástica todos os dias e honrar o que combinei comigo mesmo, isso me deixa com boa auto-estima. Quando minha razão se opõe às vontades e a disciplina ganha, minha auto-estima cresce. A auto-estima não tem nada a ver com beleza, vaidade, espelho...
Gikovate: Nem com se embelezar nem com cirurgia plástica. Uma mulher pode ficar envaidecida por estar mais bonita, mas efeito de cirurgia plástica não melhora a auto-estima, porque a pessoa não se empenhou, não se sacrificou para ter aquilo, não é mérito dela. A auto-estima tem a ver com mérito próprio. A opinião de outra pessoa sobre mim não influencia minha auto-estima?
Gikovate: Se a opinião das pessoas a meu favor no trabalho, por exemplo, vierem de realizações que atribui a mim, embora tenham sido obtidas por assessores meus, vou me sentir envaidecido. Mas, como sei que a conquista não é minha, a auto-estima não será reforçada. Não existe mutreta nesse jogo interno. Como os pais podem fazer com que os filhos tenham boa auto-estima?
Gikovate: Não adianta aplaudir tudo o que o filho faz; isso é subestimar a inteligência dele. Elogiar sem que haja merecimento leva a criança a achar que tem algum problema e que precisa ser aplaudido mesmo quando não merece. Mas os pais sempre influenciam.
Gikovate: A família deve transmitir valores. Se a pessoa não tem nenhum sistema de valores, não tem auto-estima. É comum não seguir os valores, mas todo mundo sabe muito bem que ser honesto é um valor mais digno do que ser ladrão. Quais são os valores fundamentais?
Gikovate: Você executar as tarefas às quais se dispôs, ter disciplina, capacidade de se colocar no lugar do outro, ser justo nas trocas com as pessoas, não ser egoísta nem querer mais do que dá. Ser esforçado, comedido nas pretensões individuais, não ser exageradamente ambicioso nem preguiçoso. E aí depende da cultura – a nossa é ambígua, estimula mais a competitividade que a lealdade. O senhor tem algum exemplo?
Gikovate: Certa vez, Diego Maradona fez um gol com a mão em uma final de Copa e todo mundo achou o máximo. É um exemplo negativo. Ser rico, por exemplo, é valor na nossa cultura. Às vezes, nem importam os meios que a pessoa usou para chegar a essa condição. Os valores deveriam ser tratados de uma maneira mais clara pelas famílias que querem ter suas crianças felizes, porque quem tem boa auto-estima é feliz. Como melhorar a auto-estima?
Gikovate: Primeiro, construindo um sistema de valores, depois, agindo de acordo com esses valores e desenvolvendo a disciplina. É preciso que a razão vença as vontades, a preguiça, a gula, o vício, a agressividade. É o controle racional acionado sobre si mesmo que equilibra a auto-estima e está ligado à disciplina. Como desenvolver a disciplina?
Gikovate: A disciplina é o fruto de toda uma evolução. A pessoa deve fazer acordos possíveis consigo mesma e ter humildade de reconhecer que não está pronta para mudar. Nesse caso, é melhor se propor metas que possam ser atingidas. Valores são importantes na educação...
Gikovate: Os pais não educam com palavras, e sim com exemplos. A questão da disciplina é assim também. A criança vê que os pais são trabalhadores, levam a sério o respeito com o outro e com os compromissos assumidos, são pontuais. Tudo isso define um estilo de pensar. E quem não aprendeu muitos valores?
Gikovate: Quem cresce sem essa disciplina tem de tornar consciência e colocá-la como meta. Devagar, num longo e humilde processo de crescimento, sem se propor coisas demais, subindo degrau por degrau até chegar lá. Nada que é radical dá certo. O equilíbrio está no caminho do meio. E é preciso também dar tempo para que as coisas aconteçam. “A baixa auto-estima torna as pessoas ciumentas e dominadoras, atitudes que associamos a quem nos parece mais egoísta. Elas gostam de botar banca, mostrar que estão ótimas, que se adoram e são superfelizes. Essas pessoas toleram mal as frustrações e as inevitáveis dores da vida. Rose Delfino